Não sei como cozinhar isto. (Cozinhar Ana, mesmo num assunto destes, vocabulário ligado à comida? Chiças!).
Os sentimentos de perda, às vezes, não têm pontas. Quando têm, é mais fácil!?
Aquilo que se vai conquistando na vida tem o valor que lhe queremos dar. E no meio disto tudo, as coisas com valor material fazem sentido quando delas tiramos o máximo partido, quando as partilhamos ou quando lhes associamos outras coisas boas, mesmo que inconscientemente.
E o meu carro era um dos símbolos importantes na minha vida, percebo-o agora. Percebi ontem, quando chorei ao vê-lo partir, no reboque, acabado. O reboque não levou um carro queimado, que alguém há-de arranjar e vender um dia.
O reboque levou as poupanças da menina jornalista que começara a sua vida profissional há poucos anos. A menina que estava ainda no começo de uma jornada no mercado de trabalho que tudo lhe prometia. A menina que vivia com os pais e começava a lançar as sementes para a independência, que um dia iria ser total.
Não foi, portanto, o carro que foi no reboque. Nem é o dinheiro que se consumiu em chamas, num incêndio inesperado. Foi um bocadinho da minha independência, um bocadinho daquele início de vida adulta que prometia outras cores, mais planícies, menos montanhas.
Era agora a altura para escrever sobre tudo aquilo que conquistei de bom desde então e que não se perdeu, dos outros símbolos que se solidificaram, das flores que colho nas planícies onde passeio a minha vida actualmente. Mas se há coisa que eu muitas vezes reinvindico para mim, e até para outros, é poder, nem que seja num bocadinho do dia, queixar-me sem remorsos, sem medo de parecer ingrata a alguém ou a alguma coisa. E este é o meu momento.
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